Resquício

Partes de mim vão ficando por onde eu passo
Vou sobrando de cada pedaço
de tudo que já fui
Eu sou estagnada
A alegria da criança guardada
em um retrato
Já fui um laço bem mais configurado
Antes de ser amassado, desdado, rasgado e pisado
Eu sou o que sobrou
do que eu posso ser
Um respingo
Um silêncio grunhindo
Um socorro tinindo
Um zumbido de ontem no ouvido
Um olhar se enchendo…
A poeira diante da vassoura varrendo
Sou uma folha jogada ao vento
Dançando
Um olhar se esvaziando…
Uma sensação de lembrança
Quando vê, já foi
Sou cigana
Cachorro que pulou da mudança
O pássaro que canta
na gaiola que destrói
A ratoeira olhando pro rato que rói
Sou a parede do estômago
Quando a fome dói
Eu sou o arrependimento quando o ódio mata
Eu sou a força que a revolta traga
Da justiça eu sou a filha bastarda
Sou o processo da conquista
Sou o afeto do artista
Que faz os outro rir
e o artista sofrer
Sou o tempo que voa sem correr
Que mata sem sangrar
Que fala sem falar
Que rasga o silêncio
Depois de um milênio
Que volta a lutar
Eu sou a mãe que grita, beija
Olha e abraça
Eu sou a trinca do padrão repetido
Minha maior inimiga
na cela de vidro
Eu sou uma trapaça
A que abre as velhas feridas
e derruba o veneno
Sou o adormecer da mente
De quem guarda o antídoto
Eu sou o terreno
calado
O solo vivo
A profecia dos loucos
Eu sou o resquício

do sonho esquecido

655 655 Editor
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