Texto de Rodrigo Savazoni
Há mais de dez anos deixei São Paulo, capital, para morar no litoral. Por conta disso, pude ter acesso a outras perspectivas sobre o que podemos chamar eufemisticamente de projeto de desenvolvimento da elite paulistana. De cima, a imagem é explícita: condomínios fechados, mansões e piscinas, cercados de habitações precárias. O habitações precárias é um nome técnico. No Brasil, 85% das casas não tiveram a participação de um engenheiro ou arquiteto em sua edificação. Essas habitações precárias também são chamadas por seus donos de casas e lares e foram construídas por pessoas que se adensaram nas áreas de risco porque não tiveram opção. Essas pessoas estão ali – e só por isso são aceitas – com a finalidade de “manter” o padrão de consumo de quem quer transportar para onde for as mordomias com as quais está habituado na capital do “non ducor duco”. Tudo isso com a conivência de administradores que se elegem tratando da vocação turística dos balneários costeiros, sem levar em consideração as necessidades dos moradores. Um círculo vicioso e nefasto. Tudo faz sentido agora?
É ideológico, sim! Uma ideologia que produz a crise climática e essa abissal desproporção de renda e propriedade. A chuva vem e acaba com a “diversão” de quem muito tem. A chuva vem e leva na enxurrada a vida de quem pouco tem e muito trabalha. É preciso cobrar essa conta de quem é efetivamente responsável por ela. Toda solidariedade às famílias afetadas.
De forma tímida, infelizmente, faz anos que temos promovido, pelo @procomum, laboratórios para fomentar soluções comunitárias à crise climática na Baixada Santista. Um dos nossos parceiros tem sido o autor dessa imagem, o @geopanoramas. É, a gente enxuga gelo, na maior parte das vezes. Mas tenta fazer algo. Quando a morte chega galopando a impunidade e a indiferença, a indignação aumenta.
Infelizmente, já virou regra.
A esperança é que o novo governo tenha compromisso real com a justiça social e climática, e crie um amplo programa nacional de atenção para as famílias mais vulneráveis aos extremos ambientais. É urgente, é pra já, e parte do recurso deveria vir de um fundo a ser constituído da taxação dos proprietários de mansões do litoral.
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