Terminou mais uma edição do LA Cuida e só quem viveu, sabe. Marília Guarita, Gerente do projeto, nos trouxe valiosas impressões a respeito de todo o processo que podem ser aplicadas em diferentes processos da vida.
O La Cuida foi um laboratório de inovação cidadã, onde durante dias (primeiro em Cali e depois em Montevideo) foram prototipadas dezenove iniciativas locais de economia de cuidado. Para mim, o La Cuida em si foi o vigésimo protótipo, um meta projeto de como fazer um lab/encontro/experiência/revolução onde o cuidado e a colaboração radical se sobrepusesse ao “fluxo natural” de disputa e do descuido do mundo dos homi branco. Um outro jeito de fazer as coisas acontecerem. A coisa mais dura e bonita que já fiz. Costuras físicas, mentais, energéticas, afetivas e espirituais ININTERRUPTAS. No paralelo, a certeza que só um controle orçamentário (em pesos, em reais, em dólar) muito rigoroso bancaria (em todos os sentidos) a convicção de se poder fazer diferente. E, rolou. Rolou intenso, denso e gigante.
Anedotas de processo, que não carecem de contexto. Eu pra mim:
-Institucionalidades públicas, privadas, as ong, a sociedade civil, minha equipe, nossa equipe. Eu, ela e a gente: interesses, dores, paranóias e demandas que não cessam. Hay que ceder, engolir amarguras para saborear coisas imensas. (Para o próximo La Cuida, talvez ao lado do Sendero de Cuidado, a ” Tenda da Egotrip”, com referências anarcopunk. A Cinthia sabe mesmo de tudo)
– Nessa urgência bizarra do mundo, a gente esquece da divindade do tempo, que traz resposta inusitada e tudo dilui. (a ansiedade é um pouco patética… Lia sabe esperar).
– Permitir deslocamentos e confiar nas voltas que processos e pessoas podem dar. Afinal, dá pra ir profundo sem ser e sentir um monte de coisa contraditória? (ou, como diria o Gil: o bom tbm pode ser mau e o mau tbm pode ser bom).
– E essa pira doida de ficar o tempo todo criando (e cancelando e recriando) narrativa? Apenas parem (paremos)…. isso faz com que muitas vezes se percam detalhes e sossegos. Nada é o que parece ser, nem tudo precisa de contorno e as pessoas são bem mais complexas do que mini bios…
-Talvez a gente devesse ser mais realista em relação à precariedade humana. Demorou pra gente naturalizar essas coisas que todo mundo sente como inveja, raiva, fracasso….E ao mesmo tempo, continuar rechaçando a vibe invejosa/raivosa/fracassada. ( Lulu, minha jovem sábia que me ensina: pode sentir, mas deixa ir….)
– Será que essa separação entre estratégico e operacional não é mais um artifício de dominação, de hierarquizar poder e saber? Será mesmo que a gente não tem que pensar na estratégia a partir da mão na massa, do detalhe, da repetição, do braçal? Será mesmo que quem executa não tem condições de pensar em estratégias mais exequíveis e eficientes? (peguei a visão, Raul)
– Não adianta militância/grupo/política de cuidado se a gente não for capaz de cuidar( e ser cuidado) por quem tá perto da gente, na fritação da rotina, do alcance. Descolonizar/despatriarcalizar o cuidado. Se não, não é cuidado vira umas coisa bizarra, melhor não nomear.
– Nem sempre cuidar é resolver. Às vezes, pelo contrário. Nem sempre colaborar é dividir, por igual, o trabalho. Dividir (e questionar, obrigada tanto, Sol) poder é a urgência, ainda que puta que pariu. (Tá tudo bem ir, voltar e ir de novo, mas tenha sua dupla)
– Se eu continuar trabalhando só com quem eu amo (pior/melhor que amo de verdade), talvez sempre dê certo.
Ps: Durante os 10 dias de laboratório, todos os dias antes de dormir eu dava uma lidinha no texto “15 Hábitos supremacistas brancos enraizados nas organizações – e seus antídotos” do Kenneth Jones e Tema Okun traduzido pelo Instituto Mariele Franco. Esse texto deveria ser obrigatório em qualquer formação de gestão.
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