Laboratório Santista (LABxS) ocupará antiga sede do Prato de Sopa, no centro de Santos

O Instituto Procomum e a Associação Prato de Sopa Monsenhor Moreira celebraram, nesta sexta-feira, 4, um acordo de comodato que envolve a cessão por cinco anos do imóvel da rua Sete de Setembro, centro de Santos. No edifício funcionou por mais de 70 anos o Prato de Sopa, oferecendo à população de baixa renda uma série de serviços sociais, principalmente de alimentação e saúde. Agora nele funcionará a sede do Laboratório Santista (LABxS), um laboratório cidadão criado pelo I.P no ano passado e que articula uma rede de pessoas, iniciativas e infraestruturas para promover os bens comuns da Baixada Santista.

São mais de 1200 metros quadrados, distribuídos em inúmeras salas e galpões, que passarão a ser utilizados para dinamizar a inovação cidadã, a cultura livre e a as atividades comuneiras da região. Sua ocupação ocorrerá por meio de um processo colaborativo que terá início na segunda semana de agosto. A ideia é que até o fim de 2017 seja desenvolvido um plano diretor de uso do imóvel e um projeto técnico de reforma para viabilizar sua nova destinação. Em outros lugares do mundo, laboratórios com as mesmas características conjugam ambientes culturais e de trabalho coletivo, salas para reuniões e oficinas, makerspaces, hackerspaces, entre outras possibilidades.

Desde 2015, quando a Prato de Sopa suspendeu parte das suas atividades, o imóvel estava com uso reduzido. O plano da associação sempre foi encontrar uma organização que pudesse dar ao endereço uma destinação social e que contribuísse com as necessidades da população de baixa renda que vive no entorno – o imóvel está localizado nas proximidades do Mercado Municipal, em uma rua perpendicular à Av. Conselheiro Nébias. As negociações para o desenvolvimento da parceria se iniciaram há cinco meses, quando as diretorias das duas organizações se conheceram, apresentadas pelos parceiros do Instituto Elos. O prédio será cedido sem custos. Ao IP, caberá cuidar e melhorar da infraestrutura.

Uma história de apoio aos “de baixo”

O ano era 1929. Nos Estados Unidos, o capitalismo entra em colapso. A bolsa de Nova York vai à bancarrota. No Brasil, é o início do fim do grande ciclo do café, que era a principal economia do país. Santos, principal sede da exportação cafeeira, mergulha numa grave crise. “Os carregadores portuários – na maioria, portugueses que moravam no Morro da Nova Cintra -, passaram por um período de fome e muitos deles batiam de porta em porta, mendigando alimento”. Um grupo de mulheres resolveu se solidarizar com essa situação e passou a distribuir alimentos gratuitamente para esses trabalhadores. Foi assim que se iniciou a atuação da Prato de Sopa.

Em 1943, sua sede própria foi inaugurada, na Rua Sete de Setembro. Em 1960, o espaço passou por uma grande reforma e a entidade foi reconhecida como de utilidade pública pela Prefeitura de Santos. Em 1975, novo ciclo de reformas e amplição, com a construção de um dormitório com instalações sanitárias. No local passaram a ser abrigados doentes que recebiam alta dos hospitais públicos mas eram devolvidos às ruas em estado de fraqueza e convalescença. Nesse dormitório, eram tratados até ficarem plenamente restabelecidos. Em 1986, é declarada de utilidade pública pelo Governo do Estado de São Paulo, o que contribuiu para a sua manutenção.

Dona Maria Luiza da Cunha Magalhães presidiu o Prato de Sopa da década de 1940 até 1988, quando faleceu repentinamente. Foi sucedida, então, por sua filha, Maria de Lourdes Magalhães Ozores, que obteve do Governo Federal a declaração de utilidade pública, em 1993, juntamente com o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social pelo Conselho Nacional de Assistência Social. Maria de Lourdes manteve o Prato de Sopa em funcionamento, lutando bravamente para superar as dificuldades financeiras. No período de sua presidência, a associação também deixou de lado seu caráter mais assistencialista para trabalhar pela inclusão social e o resgate da cidadania. Em 2015, as atividades foram suspensas e a sede fechada ao público.

Um novo ciclo se inicia

O ano é 2017. Desde 2008, uma nova crise colocou em evidência os limites do desenvolvimento predatório que está levando o planeta – consequentemente a humanidade – à exaustão. Mulheres e homens, do mundo todo, porém, estão buscando construir alternativas que nos permitam caminhar em melhores direções. Entre esses atores, estão aqueles que defendem os bens comuns – a natureza, os espaços públicos, o digital. Em várias partes, surgem espaços destinados a fomentar ideias e processos que mostrem outras maneiras de viver e produzir, socialmente e ambientalmente sustentáveis e baseadas em arranjos comunitários de governança: são os laboratórios cidadãos.

 

 

O LABxS (Lab Santista) faz parte desse movimento. Começou a ser concebido em uma residência de inovação cidadã organizada pelo MediaLab-Prado e pela Secretaria Geral Ibero-Americana, em Madri, em 2015. Depois disso, seguiu sendo elaborado por meio de um processo aberto de escuta e cocriação, realizado entre março e junho de 2016. O LAB.IRINTO – Encontro Internacional de Cultura Livre e Inovação Cidadã partiu de três perguntas: a Baixada Santista precisa de um Laboratório Cidadão? Se sim, como deve ser esse laboratório? A quem ele deve se destinar? O primeiro passo foi encontrar os “fazedores” locais e convidá-los a se somar a essa aventura.

Mapeados os projetos locais, o segundo passo foi conectá-los a experiências brasileiras e internacionais. Em junho de 2016, ocorreu um encontro colaborativo com participação de representantes de todas as regiões do país, da América do Sul, Central, Europa, Ásia e África. Projeto concebido, financiamento obtido, no segundo semestre de 2016 nasce o LABxS, mirando ser uma plataforma para fortalecer essa rede simultaneamente local e global. Em 2017, o laboratório realizou inúmeras atividades, com destaque para o círculos de formação e o Circuito LABxS 2017, uma chamada pública que contemplou o desenvolvimento de 13 projetos de cinco cidades, nove deles de promotoras mulheres, sendo cinco delas negras. E a história continua…

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