Durante a sua estadia no Programa Residências LABxS 2018, Sumugan Sivanesan criou o Almoço Contra o Trabalho, encontros semanais de resistências e ativismo na cozinha da sede do Lab Santista. Também visitou comunidades que coletivizam o ato de plantar e come.
A residência artística de Sumugan Sivanesan, malasiano radicado em Berlin, Alemanha, não foi marcada por apresentações, performances, exposições ou qualquer outra forma que estamos acostumados a enquadrar a arte. Durante o mês de novembro, o artista-ativista utilizou a alimentação como estopim para tecer redes e criar laços de confiança, fomentando o ativismo e a autonomia como ferramenta para enfrentar crises econômicas e políticas.
Ou seja, é um artista preocupado com as questões mais urgentes e vitais para a humanidade. A sua arte pode ser definida como uma estratégia para criar espaços de confiança e de construção de redes, de segurança e coletividade.
A trajetória de Sumugan Sivanesan é marcada por questões como o direito dos refugiados, dos aborígenes e por coletivos hackers, de justiça social, solidariedade e de mídia na Austrália e na Europa.
A residência foi assessorada e coproduzida pelo artista e cozinheiro Diego Andrade.
Almoço Contra o Trabalho
Todas as quartas-feiras de novembro Sumugan convocou encontros na qual as pessoas cozinhavam juntas. A proposta inicial era investigar o conhecimento das pessoas em relação as plantas e desenvolver narrativas, ética e hábitos adequados a era da crise alimentar que vivemos – marcada por extinção de espécies, aumento de desigualdades e autoritarismo.
“Em tempos de autoritarismo, o projeto questiona para quem e para o que estamos trabalhando. Vivemos e trabalhamos em um mundo que é desenhado para que o valor retorne somente para uma pequena elite. E no Brasil, foi ainda mais significante atuar logo após as eleições”, comentou Sumu.
A comida como um bem comum
E o trabalho de Sumugan Sivanesan não ficou restrito a cozinha do Lab Santista. Ele também compartilhou conhecimento e aprendeu com as comunidades da região.
Visitou a horta comunitária Bons Frutos, no Jardim São Manuel, bairro portuário de Santos, onde colheu alimentos frescos e pode aprender sobre o plantio, uso medicinal e alimentar das plantas.
Fez a “xepa” com as sobras dos alimentos do Mercado Municipal e cozinhou sopas que foram distribuídas de noite aos arredores da Bacia do Mercado.
E também visitou à aldeia Tekoa Paranapuã, São Vicente-SP, para aprender sobre resistência, subsistência alimentar e saberes ancestrais com a liderança Guarani MBya Mirim Santos. A liderança Guarani nos contou que a proibição do plantio de alimentos restringe a autonomia da comunidade e como os alimentos industrializados atacam a saúde dos seus membros – as enfermidades causadas pelos alimentos não são espirituais e não podem ser curadas na casa de reza.
Os alimentos são tecedores de redes
Depois da residência artística no LABxS, Sumugan Sivanesan desenvolveu a ideia Food +, uma tentativa de desconstruir e relançar os atos cotidianos de cozinhar e comer.
“É mais do que apenas comer para viver, mas sim uma forma não elitista do conhecimento alimentar. Eu sempre enfatizei meu trabalho em experimentação e sociabilidade acima da técnica ou conhecimento. Não estamos falando de receitas, ingredientes ou recursos e sim como nossas escolhas alimentares e desenvolvimento de éticas em relação ao comer e cozinhar podem transformar hábitos e atrair pessoas, possibilitando a criação de amizades, alianças e redes de segurança”, comenta o artista.
Sumugan Sivanesan comenta que a produção global de alimentos baseada em um sistema agrícola industrial, regulamentações trabalhistas fracas e irregulares e moldados por interesses corporativos não são ecologicamente nem eticamente corretos. “Embora possa não ser prático retirar-se em massa desses sistemas, é possível trabalhar criticamente dentro deles”, disse.
Em um mundo marcado por desigualdades e violência, o artista busca estratégias para resistir e sobreviver.
“Como as potências mundiais desenvolveram as sociedades modernas para aceitar e normalizar certas formas de violência, por exemplo, a desigualdade econômica estrutural, o que permite que esses problemas intensifiquem-se. Assim, perseguir alternativas para perpetuar ciclos de violência implicaria implantar estratégias de não-violência”, concluí Sumugan Sivanesan.
E isso é possível construir e tecendo redes, trabalhando em solidariedade. A arte e os alimentos como ferramentas para unir conhecimentos e saberes, criar conexões e espaços de cuidado e segurança.