Naldo Alves

Por dentro do LAB: “todo jardim é um quadro”

O cotidiano de um laboratório cidadão é cheio de riquezas e surpresas. Algumas delas podem passar despercebido mesmo para os seus frequentadores diários. Esse texto é uma tentativa de trazer um pouco do encantamento diário que vivemos aqui.

Nos primeiros dias de janeiro, o LAB Procomum recebeu a visita de Naldo Alves, ator, realizador audiovisual, poeta e jardineiro, para remodelar o jardim do nosso laboratório cidadão.

Conhecemos Naldo durante o #mymarkmycity e ele voltou para nos encantar com suas técnicas de jardinagem, seu sorriso e companheirismo. Do novo jardim surgiu uma ideia: que tal criarmos um GT de jardinagem?

Sentamos para um conversa descontraída sobre jardinagem, natureza, natureza humana, conhecimento e arte.

Victor Sousa: Fale um pouco sobre você e como você chegou aqui.

Naldo Alves: Meu nome é Naldo Alves, não vou entregar curriculum, por ego ou timidez, porque faço muitas coisas.

O processo de jardinagem aqui no LAB começou porque frequentei o evento #mymarkmycity. O processo foi muito legal e queria doar meu tempo para essas pessoas que me receberam tão bem. Apesar de fazer muitas coisas, hoje a minha principal atividade é a de jardineiro na praia, é o que me sobrou no momento. Por que não doar um pouco do meu tempo e deixar essas pessoas inteligentes mais alegres e felizes?

Quando você passa por um jardim, ele te dá um ecanto. Vocês estão em processos de concentração e trabalho, precisam estar felizes. E nada mais justo do que trazer as plantas. Cheguei aqui e comecei a fazer.

A Marina (coordenadora do LAB Procomum) me ligou e perguntou “Quanto você cobra?”. Eu respondi que estava fazendo e depois ela podia ver isso. Não é somente pelo dinheiro. Tem coisas que não estão no âmbito financeiro. É mais a questão do amor pelo o que você faz. Mas ela respondeu “Mas você tem que ganhar”. Eu não vou saber, eu não sei quanto, eu não estou preocupado.

O jardim mostra para a gente que a natureza é cíclica e aprendemos que há outros modos de vida. Quando você olha um jardim, ele te traz uma sabedoria. Basta olhar processo de uma planta: primeiro ela encara a terra, cresce, encontra dificuldades, chuva, água, insetos, pessoas que pisam, e então floresce.

O ser humano é igual a natureza, apesar de ter esquecido isso. Ele adapta-se muito rápido. Se percebêssemos o quão adaptável e belo somos, como os outros seres vivos, talvez não estaríamos brigando, lutando para conquistar e tirar do outro. A natureza não tira, ela equilibra e a gente esqueceu que faz parte da natureza.

O processo de jardinagem faz você pensar nisso o tempo todo, é só você estar aberto para querer aprender. Penso que as vezes não queremos mais aprender, e nesse momento a planta humana envelhece e morre. Porque o cupim da falta de aprendizado te vai podando e você vai atrofiando.

O conhecimento tem que ser dividido. Pessoas são bibliotecas humanas que morrem e quando você guarda o conhecimento para você, a biblioteca fecha.

V. S: Como foi o processo de jardinagem aqui no LAB?

N. A: Aqui eu tirei um pouco o excesso de informação. Você pode imaginar isso nas cores, se você vê muitas luzes piscando a sua vista fica cansada.

Eu tirei um pouco do excesso e deixei mais limpo. Paisagismo você trabalha com três planos: alto, médio e baixo e com cores – se não tem muitas cores do disco cromático, você trabalha com harmonia geométrica e planos para a forma de parede que temos aqui.

É muito simples. Agora o que falta são flores e cores para aumentar a criatividade. Cada cor traz uma sensação diferente. Tem cores que acalmam e cores que animam.

Todo jardim é um quadro e todo quadro tem que ter um equilíbrio – seja na cor, nas formas, nos desenhos. Você vai ver plano alto, médio e baixo; o plano de foco; as cores equilibradas; os formatos geométricos.

É simples, qualquer um pode fazer. E você tem de errar no processo de jardinagem. Tem de experimentar e sentir a natureza e perceber a planta. Se é de determinada estação ou lua. Determinada planta não posso plantar na lua cheia porque a água sobe, e sim na minguante.

Pergunte sempre para os jardineiros mais velhos. Mas pergunte algo para os mais novos também. Todo jardineiro sabe algo. Todo ser humano sabe algo.

Se eu te fizer uma pergunta técnica você pode não saber e você pode me perguntar algo técnico e eu não saber. Todo mundo está em cheque porque você pode saber mais do que eu e eu mais do que você. Vamos trocar!

As (nossas) bibliotecas temos que compartilhar, não podem ficar paradas. Eu fui aprendendo tanto e percebi que não sabia nada. E ainda não sei. Eu quero aprender e tenho essa necessidade. Quanto mais você aprende, você torna-se uma pessoa melhor. Torna-se uma pessoa mais simples e para de brigar por coisas pequenas ou por birra.

A semente da planta já cresceu. A gente fala sobre natureza e também sobre natureza humana porque somos parte dela. Também somos plantas que morremos.

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