Qual é o seu ateliê?

Fabrício Lopez, é um dos mentores da Colaboradora Artes e Comunidades. Para o início do ciclo formativo que nos propôs “Ação Gráfica na Cidade” acordamos uma espécie de colóquio, para que compartilhasse com o grupo de artistas um pouco do seu olhar sobre a arte contemporânea e sobre sua trajetória artística, que percorreu tantas paragens e segue frequente no circuito Santos/São Paulo.
Fabrício nos recebe em seu recôndito ateliê, lugar onde nos conta trabalhar só, e de importância crucial para a organização de seu fazer artístico e para sua vida como um todo. De banheiro limpo, montinhos de serragem nos cantos, um edredom estendido em meio a alguns banquinhos e cadeiras. Em uma das mesas designs expostos, de trabalhos seus e em parcerias. A água nós levamos, assim como a curiosidade. E depois a admiração pelo espaço, o qual mais adiante entenderíamos se tratar de uma terapia em si, além de um dispositivo para a criação de caráter.

“Vou apresentar um pouco do meu mestrado, mas a formação não tem, absolutamente, relação com ser artista”. Match com o mentor. Uma realidade muito comum ao nosso grupo, assim como de grande parte da comunidade de artistas frequentadora do Lab Procomum, é de autodidatismo relacionado aos processos criativos.

Quando questionado se escreve projetos e gerencia sua própria carreira, ele cita Mário Pedrosa e o artista produtor autônomo, dando a entender que sim, que é importante a(o) artista se revestir das condições para levar adiante seu trabalho.

Em sua fala vai levantando alguns pontos que fazem todas(os) pensarem. “Acontece do artista ser pobre. Ou melhor, é uma condição que está dada na maior parte das vezes, já que a arte é disfuncional. Mas não dá pra ser um artista pobre e desorganizado. Artista não é livre, é necessário criar uma rotina; é preciso ter método, organizar um sistema, ter uma postura integrativa e consciência de si. E para isso o lugar da prática precisa ser reverenciado”. Neste ponto vemos confluência com as reflexões que Nina Guzzo (mentora do projeto também) e Conrado Federici levantaram na formação “Metodologias Radicais para práticas artísticas”, na qual questões como: Como eu faço o que eu faço? Como posso organizar o que eu faço para que consiga ficar ainda mais claro e preciso? foram abordadas.

O grupo, ao ver as imagens do fazer artístico de Fabrício e constância, questiona como é possível, se ele nunca teria passado por crises, se nunca pensara em desistir…o artista, muito resoluto, diz que não. Que apesar de todas as dificuldades, despesas e decisões que tem que bancar para sustentar sua dedicação, não abre mão da carreira pois nunca pensou ser outra coisa, nem do ateliê, porque ele é necessário. Traz a referência de Joseph Beuys, sobre o trabalho ter de se retroalimentar para ser viável. Além disso, tranquiliza os corações ao sugerir que as coisas para fazerem sentido demandam tempo e autocrítica.

Diferencia a produção da distribuição, admitindo que muito se possa criar sem que essa produção seja modulada pelo mercado e ao mesmo tempo que a não comercialização de obras, ou sua exposição ao público e às instituições, possa levar à dificuldades materiais para a própria produção.

Fabrício se preocupa em não dar uma de coach, mas entre os bons conselhos que presta ao grupo, estão as residências artísticas como experiências ricas de aprendizado e trocas entre artistas.

Por último, conta sobre seu trabalho no Instituto Acaia, com dezenas de crianças e jovens de baixa renda, e coloca a transmissão do conhecimento como compromisso político. Fala do trabalho de forjar artistas por espelhamento, em que podemos nos comprometer e exemplifica que uma visita a um ateliê pode mudar a vida de alguém, dado que nunca se sabe o que pode irromper nos sujeitos.

Apesar da quase incredulidade de algumas/alguns colaboradoras/es com essa dinâmica e esse espaço/dispositivo/lugar/útero/ateliê, tentando encontrar respostas plausíveis na configuração astrológica do artista (ser pisciano com ascendente em Virgem e Lua em Gêmeos daria conta de explicar os mistérios em cena), saímos animadas/os, fervilhando de inquietações e motivadas/os a pensarmos em como nos situamos e protegemos nossas configurações de trabalho para criarmos.

Quais disposições são possíveis a cada um(a)? O que cada produção artística exige e do que se alimenta?

A todo o tempo Fabrício localiza a arte como condição do humano, deslocando qualquer visão aurática para um olhar sobre as marcas deste fazer no mundo.

Vamos caminhando pelas ruas da cidade, percebendo os movimentos do território e repensando ideias de projetos e dos passos a seguir…

2560 1920 Editor
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