Por Victor Sousa e Soledad Maria
Durante a última semana de março, parte da nossa equipe esteve na Argentina e no Uruguai para as atividades de estreia da área de “Expansão e Impacto”.
Em Buenos Aires (ARG), assinamos a criação de um consórcio de inovação e participação política. O CILA – Consórcio Internacional de Localidades em Ação, que deseja impulsionar formas inovadoras de governanças e ações coletivas em diferentes cidades do Sul Global.
De lá, nossa jornada seguiu para Montevidéu (URU), a fim de iniciar a pesquisa e o mapeamento que facilitarão o reconhecimento e a articulação de ações e iniciativas comunitárias desenvolvidas na América Latina e que tenham como foco práticas de cuidado. Seja na cultura, na economia ou na política.
Ao longo dos últimos dois anos pandêmicos, os debates e pensamentos em torno da Economia do Cuidado cresceram dia a dia e globalmente, recebendo uma atenção especial do democrata Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, em sua posse. Etimologicamente, a palavra economia é formada a partir da combinação de eco, echo (latim) – lar/casa com o apositivo nomia – cuidar/gerenciar. O termo, chama atenção para o trabalho que se dedica à sobrevivência, bem-estar e/ou à educação das pessoas, destacando o fato desses trabalhos serem majoritariamente realizados por mulheres, sendo as mesmas invisibilizadas e não remuneradas. E que, mesmo no meio profissional, costumam ser terceirizados e mal pagos. Como dica de leitura, confira o verbete do Draft sobre o tema.
As primeiras atividades do projeto, objetivavam tecer redes de intercâmbio que pautem a Economia do Cuidado na América Latina.
Como, dentro da nossa metodologia – o nosso jeito de fazer as coisas – a escuta é a primeira etapa para a construção de redes. Perguntamos para as lideranças feministas de Montevidéu o que é o cuidado para elas.
Lilian Celiberti, fundadora do Cotidiano Mujer
“Cuidado, na minha opinião, é primeiramente uma ética social. É política em um sentido amplo da palavra, das relações de cuidado, que em realidade são postas pelo feminismo a partir de uma desigualdade, afinal as tarefas são feitas por mulheres, de reprodução da vida.
Por isso, o cuidado tem relação com a reprodução da vida. E isso é ao mesmo tempo, sutil e profundo. É a trama da vida. Porque inclui a relação com a natureza que nos rodeia, com as formas de produzir e consumir.
Os humanos e humanas são seres que precisam uns dos outros. A ideia do cuidado a partir da individualidade, só existe para os homens de classe média, alta, brancos e heterossexuais. E esse é um conceito liberal do cuidado.
Por outro lado, o cuidado que parte da vulnerabilidade, dos vínculos sociais, das pessoas. O cuidado como comunidade, porque parte dos parte dos nossos problemas de nossa sociedade neo liberal é que perdemos os vínculos de solidariedade. O cuidado entre as pessoas requer vínculos de solidariedade e comunidade.
E não podemos esquecer a eco-dependência. Estamos em um plane cuja a ideia do antropoceno está no limite de suas possibilidades. Vide as mudanças climáticas.
E essa é uma questão que não pode ser vista de maneira puramente acadêmica. É uma construção cotidiana, que tem a ver, por exemplo, de como nos relacionamos com os agro produtores, de como trazemos o campo para a cidade. De como geramos comunidades em nossos bairros. É também sobre cultura popular e vínculos.
Então, reverter a discussão de cuidado para para os cuidadores, é perder a oportunidade de criar uma transformação verdadeira”.
lguita Celestino, líder comunitária e uma das pessoas que foram desalojadas do Bairro Sul de Montevideo em 1978.
“No meu sentimento,como avó e bisavó, que sou. Cuidado é primeiro minha família. E cada membro tem o seu lugar. O ser humano é filho, adolescente e começa a ser adulto. Todos são iguais e importantes e nos fazem lembrar que não se deve perder a atenção amoreza e nem a atenção da firmeza.
E o mesmo que desejo para minha família, desejo para os demais. Como vizinha, ajudo os filhos deles. É assim que se faz uma boa comunidade. E penso, que em nosso país ainda fazemos isso. Todos nós, latinos, cuidamos uns dos outros”.
Noelia Maciel, diretora da Coordenadoria Nacional Afrouruguaya
“A meta é conhecer e reconhecer as outras pessoas. Ver as necessidades e que elas podem ter a ver com a minha. Empatia. Ninguém está sozinho. Vivemos em interdependência e um precisa do outro. E para poder apoiar, é preciso também conhecer as nossa necessidade e o que podemos dar. Porque sozinha, não posso resolver nada. É preciso comunicação e sentimento de comunidade”.
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