Inspirada nas dependências do LAB, visando um mundo mais sustentável, resolvi adquirir uma caixa de compostagem para reduzir meu lixo orgânico e produzir meus próprios insumos para minha pequena horta de apartamento.
Era para ser uma ideia que me trouxesse bem estar já que colaborar tem sido meu atual verbo, estaria colaborando com o mundo reduzindo meu lixo, porém não imaginei que me traria tantos sentimentos e reflexões.
Fiz a compra do kit, aguardei ansiosa sua chegada.
Pois bem, chegou.
Junto às caixas e serragens um pacote inusitado e pesado, o qual me atentei ao fato de que estava traficando seres vivos, mas lá estava eu agora detentora de um pesado saco de tnt cheio de – minhocas para compostagem.
Imediatamente ao me deparar com ele, corri para ler as instruções, e nelas havia as recomendações de como acondicioná-las de maneira confortável para iniciar o processo.
O QR Code, isso mesmo, as instruções vieram assim, apesar de moderno, tinham umas informações bem estranhas, como por exemplo, dizendo da possível morte de algumas, durante a viagem, e também de que as mesmas chegariam “estressadas” devido à travessia de Presidente Prudente à Praia Grande.
Na hora que li, já me veio um riso contido, seguido de um pequeno calafrio de historiadora:
– Estressadas? Que termo interessante para minhocas, o que será que desestressa minhocas? Passeio na orla da praia?
Segui rigorosamente as instruções, de que em quatro dias no máximo o “sistema” estaria pronto para a missão compostagem.
Já nos dias subsequentes minha rotina foi alterada drasticamente, as minhocas saiam enlouquecidas da caixa e andavam perdidas no meio da área de serviço, indo para não sei onde.
Um pequeno caos se instalou, minha sobrinha gritava ao se deparar com as minhocas, a cachorra latia para elas, e eu gritava ao vê-las andando a esmo no piso branco, como que perdidas na neve; e para resgatá-las e colocá-las de volta ao seu… “lugar”: a caixa de compostagem.
Os dias foram assim, minhocas saindo de minúsculos buracos, pequenos gritos e Lilica, a cachorra, resolveu experimentar uma de espaguete. Foi bizarro!
Mais gritos, e mais QR Code que nada mais explicava essa insurgência em massa, resolvi como pesquisadora que sou, conhecer minhas novas “hóspedes”, assim preferi chamá-las.
Pesquisei tudo sobre elas.
Nomes para lá de estranhos diziam sobre a espécie, onde descobri que existem 8000 tipos de minhocas… Isso mesmo 8000, no Brasil 26.
Fiquei imaginando como se diferenciam 8000 tipos de minhocas!
Enfim, descobri que apesar de hermafroditas, elas precisam copular num ritmado 69 também bem bizarro.
Que elas possuem saco escrotal, líquido semiótico, ovários, sistema nervoso, cérebro e um sistema digestivo complexo, com intestino longo que termina no ânus!
Fiquei em choque! Resolvi na hora de recolocar as fugitivas, observá-las melhor, e imaginei que o Google estava de sacanagem comigo.
Lá pelo quarto dia, o QR Code estava certo, elas acalmaram, ou resolveram fugir do destino de espaguete da Lilica, se aquietaram, muitas morreram, ou quem sabe até se suicidaram.
Já está na hora de iniciar a compostagem, porém são 3:24 da madrugada e eu ao invés de estar dormindo ou me sentindo uma pessoa sustentável, comecei a pensar diferente.
Eu adquiri seres vivos, que foram retirados de sua terra húmus natais provavelmente de maneira pouco confortáveis e forçadas a uma viagem num saco escuro sem saber seu destino.
Chegaram num local desconhecido e tentaram de todo jeito fugir, provavelmente não era apenas instintivo, e sim uma revolta contra seu novo destino.
Irão trabalhar arduamente, por comida e caixa fechada, num processo incessante de promover meu lucro, ou seja, meu chorume futuro.
Produzirão sem parar, segundo o Google suas fezes que serão o tal húmus de minhoca, acondicionadas num espaço restrito, sem sol , sem luar, sem água da chuva, sem poder escolher seu alimento ou passeio, e apesar de estarem na praia, sem ao menos sentir a brisa refrescante do outono.
Produzindo, produzindo, e eu uma latifundiária escravocrata de merda!
Será que existe outro meio de produção que não a exploração indevida, mesmo que para um fim tão nobre como reduzir lixo? Mesmo se tratando de minhocas?
Hoje na Colaboradora aprendi que poderíamos trocar sem necessariamente monetizar, o banco de tempo me pareceu tão bacana de ser vivenciado entre meus novos amigos de jornada, onde aquela máxima idiota de que tempo é dinheiro, podemos transformá-la em algo tão mais decente no tratar com outros seres vivos.
Sinto-me uma hipócrita!
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