Texto de Danilo Alves, Coordenador Educacional do Instituto Procomum
Bacia do Mercado: Revitalizar para o comum?
Tem início nesta quinta-feira, dia 25 de Agosto, o processo de revitalização da Bacia do Mercado de Santos, que se insere no plano de Revitalização do Centro Histórico de Santos, proposto pela Prefeitura e que tem como objetivo o desenvolvimento econômico e social da região.
Além da expansão da linha do VLT, está prevista também a reforma do edifício do Mercado Municipal, inaugurado em 1902, bem como a construção de uma nova estação de catraias. Existe a perspectiva da atração de investimentos e potencialização do turismo na região.
Este projeto contrasta com um problema há muito enfrentado não somente pela cidade de Santos mas pela Baixada Santista como um todo: a dificuldade de acesso à moradia, em especial às famílias de baixa renda.
A partir de dados do último Censo realizado em 2010, constata-se que a Baixada Santista só fica atrás da Região Metropolitana de São Paulo, no que diz respeito às famílias residentes em situação de precariedade habitacional. A dificuldade de encontrar terrenos livres para a construção de moradias, bem como o empobrecimento da maioria da população brasileira ao longo dos últimos anos são as principais causas deste quadro.
Soma-se a isso o corte no orçamento para financiamento de projetos de habitação de interesse social, como o Minha Casa Minha Vida, que foi substituído pelo Programa Casa Verde e Amarela. Este programa assume um viés de que a auto-regulação do mercado imobiliário dará cabo da demanda por habitação.
A consequência deste processo na região se exemplifica no recuo na venda de imóveis usados na Baixada Santista no primeiro semestre, quando comparado com 2021. Concomitante a isso, temos o aumento da taxa de juros (Selic), que se encontra em 13,75%, frente aos 5,25% de Agosto e Setembro de 2021.
Uma resposta para o problema habitacional que a Prefeitura Municipal de Santos tem apontado é a construção de moradias populares em terrenos da União nos Bairros do Paquetá e Vila Mathias e um projeto de retrofit na Rua Gonçalves Dias, no Centro Histórico.
Esta discussão é nevrálgica para o Instituto Procomum, uma vez que sua sede situa-se justamente neste território que encontra-se em disputa. Ao longo dos últimos cinco anos temos construído canais de diálogo e a busca de soluções para a situação de exclusão e abandono na qual se encontra não somente o território, mas a comunidade que o habita, traduzidos na falta de moradias adequadas, espaços públicos e presença maciça de moradias encortiçadas.
O processo de Revitalização da Bacia do Mercado traz a seguinte questão à baila: É possível realizar um processo de transformação urbana de uma região degradada sem que isso seja sinônimo de um processo de gentrificação? De expulsão da população que historicamente ocupa e luta com as armas do cotidiano para tornar este território mais humano?
Acredito que sim. Primeiramente com o poder público fazendo uso de dispositivos como Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsória (PEUC), previsto no Estatuto das Cidades (Lei Federal 10.257/2001) e que permite combater a ociosidade de imóveis vazios. Soma-se a isso projetos de construção de moradias populares, bem como de retrofit, como acertadamente aponta a Prefeitura.
Para além destas iniciativas, é fundamental ter a população local como protagonista deste processo, compartilhando saberes e suas próprias tecnologias por meio de laboratórios cidadãos. Em síntese, uma revitalização que vá na direção do comum e não da gentrificação, deve ter como eixos centrais o papel do poder público como moderador deste processo, não jogando a responsabilidade somente na iniciativa privada e numa suposta atração automática de investimentos, por meio de uma etérea mão invisível mercadológica. E por fim, compreendendo a população e o comércio local como parte da solução, não do problema, criando dispositivos efetivos de participação popular e manutenção de sua permanência no território.
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