COMUNIDADE PROCOMUM: GUERREIRAS DO PROCOMUM – ROBY

“Era um quarto e tinha aquela largura” diz Roberta apontando para um armário metálico cinza com portas alaranjadas e azuis no canto do ateliê de costura ativado por ela dentro do Procomum, o armário tem 1,50m de largura. “Tinha uma cama de solteira, uma geladeira, uma mesa pequena, pois eu nunca consegui comer com o prato no colo, e as roupas ficavam penduradas em um cabo de vassoura atrás da porta. Morávamos apenas eu e a minha mãe. Era no número 17 da Rua Sete de Setembro, a melhor casa que a minha mãe conseguiu”. Lá Roberta ficou até casar pela primeira vez aos 14 anos. 

 

Eu conheci a Roberta, Roby como gosta de ser chamada, em 2020 quando participávamos da Colaboradora Empreender e Transformar e naquele ano, como todos sabemos, por causa da pandemia as aulas eram todas online. Em certa aula, Roby mostrou orgulhosa os panos de prato pintados por ela e muitas vezes assistia às aulas enquanto costurava. Roby tem olhar altivo, fala assertiva e eu já a vi chorar mais vezes do que vi a minha mãe chorar. A última foi quando o Procomum nos chamou para uma roda de conversas para falarmos dos projetos que havíamos realizado com um aporte recebido do Fundo de Ativação, programa do IP de incentivo a empreendedores e artistas. A Roby usou o aporte para a aquisição de máquinas de costura destinadas ao Grupo de Trabalho Mulheres Grandes Guerreiras e é justamente a criação deste GT o motivo desta matéria, mas a história das participantes faz parte do acervo que faz o IP existir, hoje falamos de Roberta, a Roby.

A Colaboradora é um programa do IP voltado para a formação de empreendedores cujo objetivo é o fortalecimento da cooperação e aumento de repertórios através de uma jornada que compreende práticas, vivências e mentorias.  Roby tinha chegado ali, por indicação da Lu, líder do coletivo Afrotu que também faz parte da nossa comunidade, ela buscava aprofundar conhecimentos em empreendedorismo. No entanto, conta que foi em uma das ações da Colaboradora que ela percebeu que o Procomum era o seu lugar. “Teve um dia que o P.A., um dos mentorados, disse: eu, preto, pobre e viado, já viu, né?”. Roberta se emocionou com a naturalidade com a qual P.A. falou e foi ouvido.

 

“Percebi que o Procomum foi onde me libertei para ser o que sou”

 

Roberta Ribeiro dos Santos, é moradora da Baixada Santista, ora se encontra no Guarujá, ora em Santos, tem 48 anos e muita história para contar. É pansexual, artista, tem dois filhos e começou a trabalhar aos 11 anos. Durante a infância foi educada pelo pai em um apartamento em frente a praia, mas com a separação dele e da mãe, se mudou para o centro da cidade de Santos onde, segundo ela conta, se criou sozinha.  Ela revela que a mãe muitas vezes ia comprar cigarro e voltava meses depois. Mas apesar da ausência da mãe, Roby trazia consigo táticas de guerra que o pai, filho de militar, havia incutido nela: brigava com os garotos mais velhos pelo seu espaço na calçada onde guardava carros e mais tarde brigou pela ocupação do ponto de tráfico da Vila Siri. 

 

“Há 26 anos eu não tinha dinheiro pra nada. fui morar na Vila Siri, mapeei o território e invadi a boca. Lá eu fiquei por 3 anos, mas meus filhos estavam crescendo e perceberiam o que estava acontecendo. Por isso, saí”.

 

Roberta trabalhou na mesma organização de 1999 a 2012 e conta orgulhosa que lá entrou como faxineira e saiu como coordenadora dos cursos profissionalizantes após se formar em pedagogia. Durante o governo Dilma, trabalhou em Brasília como recepcionista e retornou à Baixada após o golpe de 2016, quando sofreu um acidente que a deixou imobilizada por dois meses. Foi neste período que Roberta volta a se interessar pela costura e, para passar o tempo, pede emprestada a máquina da ex cunhada. 

 

Virou artesã, no começo fazendo barras de panos de prato e após receber uma bolsa de estudos, ingressa em um dos cursos do SENAI para aprofundar seus conhecimentos na área. Assim Roby passou a executar trabalhos mais complexos até chegar onde está hoje: Roberta possui clientes fixos em seu bairro, ensina outras mulheres e realiza feiras nas quais comercializa produtos autorais. 

 

Aqui no Procomum é propulsora do GT Mulheres Grande Guerreiras que no dia 29 de outubro lançará sua primeira coleção de acessórios. GT é a sigla que utilizamos para denominar os Grupos de Trabalho do IP para os quais fornecemos estrutura para que a comunidade prototipe ideias, discuta soluções e realize pesquisas em torno de temas de interesse público. O GT Mulheres Grandes Guerreiras, parte da percepção de Roberta em relação a algumas das carências de mulheres da região. O ponto de partida para essa captação foi o terreiro da Mãe Kátia da qual falaremos em uma próxima oportunidade.

 

Há 3 meses o GT Mulheres Grandes Guerreiras ocupa o ateliê do Procomum localizado na Rua Sete Setembro, número 52, a mesma rua do início da história da Roberta. No início a sede do IP serviu apenas como abrigo para as oficinas de empreendedorismo oferecidas pelo SEBRAE, agora, graças a aquisição das máquinas citada anteriormente, as mulheres fabricam turbantes, carteiras, scrunchies e outros acessórios, que serão lançados no desfile do dia 29, neste espaço coletivo. Ali, entre agulhas, máquinas e tecidos, elas se apoiam, se cuidam, se ouvem e dissolvem as dores de suas vivências nem sempre doces. Um espaço de trocas e um final feliz para essa história. O evento que acontecerá no final deste mês contará com a presença do grupos de Maracatu  Oju Obá, apresentação de hip hop , oficina de pintura intuitiva e feira de artesanato. 

 

Para Roberta eu fiz a pergunta clichê, gostaria de saber se após tantas conquistas, ainda havia espaço para sonhar mais, ela me responde que não costuma ter muitos sonhos, pois quando quer algo, vai e realiza. Notório! Roberta, novamente com os olhos cheios de água, disse dia desses para o Vitinho, nosso gerente de inovação,  nos corredores do IP que está vivendo os melhores dias da sua vida, a preparação para o dia 29 está enchendo a nós do IP e a essas guerreiras de orgulho. Confira abaixo a programação.

11h – 12h – Laricone

11h30 – 13h – Maracatu

14h – 15h30 – Roda de conversa com o grupo Flor de Cacto

14h30 – 16h – Desfile Mulheres Grande Guerreiras

16h – 17h – Sarau dos Andradas

18h – 19h – Apresentação dos rappers Chagas e Neguinha Braba

19h – 20h – Apresentação de dança

 

 

2048 1365 Editor
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