Porque você também deveria torcer pelo Flow no Oscar

Flow concorre com Ainda Estou Aqui na categoria Melhor Filme Estrangeiro; nossa torcida é pelo cinema brasileiro, mas Flow também levanta a bandeira da liberdade

Nunca um Oscar foi tão esperado: Ainda Estou Aqui está indicado como Melhor Filme (sendo o primeiro filme brasileiro da história a concorrer nesta categoria), Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz para Fernanda Torres.

Foto da família do Deputado Rubens Paiva, assassinado pela Ditadura Militar brasileira; vítimas ainda lutam por verdade e reparação

O filme evoca uma ferida aberta na sociedade brasileira: o assassinato do deputado e engenheiro Rubens Paiva pela ditadura militar brasileira e a luta de sua mulher, a advogada Eunice Paiva em sustentar e criar a família e lutar por seus direitos. Detalhe, o Rubens Paiva nasceu em Santos e é conterranêo do nosso LAB Procomum.

Por aqui declaramos toda a nossa solidariedade por aqueles que lutaram por liberdade e democracia no Brasil. Mas hoje, vamos falar de outro filme que também evoca a liberdade, mas no caso a liberdade digital.

A animação Flow foi lançada em 2024 e foi dirigida por Gints Zilbalodis. Ele retrata a história de um gato, um cachorro, uma capivara e um lemur tentando sobreviver a uma enchente em um mundo pós-humano.

Flow é um filme produzido na Letônia

O filme foi produzido em cinco anos e meio, com equipe e orçamento reduzido. E o mais interesante: foi totalmente animado no Blender, um software livre e de código aberto, mantido por contribuidores e colaboradores de todo o mundo.

Diante do crescimento desenfreado das big-techs e proximidade de seus fundadores com pensamentos ultra-conservadores e anti-democráticos, reforçamos ainda mais a importância do software livre e das comunidades colaborativas digitais.

E estamos falando também de eficiência (e economia de recursos financeiros e ambientais). Assim como o Deepseek mostrou que é possível competir com as big techs na inteligência artificial, a dupla Flow e Blender também demonstram que a colaboração e o código aberto podem competir de frente com grandes softwares e estúdios de animação.

“O projeto inteiro levou cerca de cinco anos e meio. No primeiro ano, eu estava escrevendo o roteiro, aprendendo Blender e buscando financiamento como Dream Well Studio. Isso foi em 2019.

Em 2020, conseguimos algum financiamento, e eu me mudei para um espaço de coworking com outros artistas e desenvolvedores que estavam usando Blender. Foi lá que eu me conectei com Mārtiņš Upītis e Konstantīns Višņevskis.

Em 2021, começamos a contratar artistas conceituais e a montar a equipe. Trouxemos riggers e desenvolvedores para criar scripts personalizados que ajudaram a agilizar o fluxo de trabalho enquanto eu estava trabalhando no animatic.”

Gints Zilbalodis, em entrevista para o Blender.org

 

Sobre o Blender

Aqui no LAB Procomum nós usamos o Blender em uma série de projetos e ações. Entendemos que os softwares-livres são um comum digital e nossas metodologias e projetos são inspirados em sua filosofia, licenças e modelos de colaboração.

O software foi originalmente desenvolvido pelo estúdio holandês NeoGeo Studio que em 1998 fundou uma nova empresa chamada Not a Number criada para desenvolver e distribuir o programa, fornecendo produtos e serviços comerciais.

A empresa faliu em 2002 e seu fundador Ton Roosendaal criou a Blender Foundation e iniciou a campanha Free Blender que arrecadou EU$ 100 mil euros para liberar o programa em código aberto.

O filme foi totalmente produzido no Blender, um software livre

Em 2002, ele foi lançado sob a GNU General Public License (GPL). Hoje, ele é desenvolvido pela Blender Foundation e é apoiado por doações da comunidade e vendas de materiais relativos.

Blender é multiuso, pode ser utilizado para modelagem, escultura digital, mapeamento de textura, luz, animação, simulação de fluídos, renderização, ilustração, composição, movimentos e edição de vídeo.

O fundador do Blender recebeu um Doutorado Honorário em Tecnologia pela Universidade de Leeds.

O programa é multiplataforma e é distribuído para Windows, macOS e GNU/Linux. Ele pode ser baixado gratuitamente na página oficial do projeto e possui uma série de tutoriais, técnicas de uso e dicas online. Está disponível em 36 idiomas, inclusive o português brasileiro.

Site oficial: https://www.blender.org/

Repositório código fonte: https://github.com/blender/blender

Documentação oficial: https://docs.blender.org/manual/en/latest/

Projetos da comunidade: https://blenderartists.org/

Diretor de Flow, comemorando o Globo de Ouro

 

“O estúdio letão era relativamente pequeno, tudo cabia em uma sala. No total, tínhamos cerca de 15 a 20 pessoas, mas em qualquer momento, geralmente havia apenas três a cinco pessoas trabalhando, já que diferentes equipes cuidavam da pré-produção e pós-produção.

Eu já fiz animação, todos os tipos de animação. Comecei fazendo animação 2D desenhada à mão, animação digital. Mas depois de fazer alguns curtas, percebi que não era bom em desenhar e mudei para o 3D, porque eu poderia modelar coisas e mover a câmera. Então, no início, usei o Maya, que era o software ensinado na nossa escola na época.

Depois de terminar meu primeiro longa-metragem, Away, decidi mudar para o Blender em 2019, principalmente por causa do EEVEE. Comecei a usar a versão beta ou até mesmo alpha do 2.8. Levou um tempo para aprender algumas coisas, mas foi bem direto. Muitos dos animadores de Flow levaram menos de uma semana para se adaptarem ao Blender.”

Gints Zilbalodis, em entrevista para o Blender.org

“Aprendi muito online, mas foi ótimo ter alguém com mais experiência ao meu lado (Konstantīns). Ele fez muito rigging e era muito mais técnico do que eu, então eu podia pedir conselhos a ele. Às vezes, eu precisava de algo específico no animatic, como o cervo se movendo em espiral, e ele escrevia um script para automatizar isso. Isso foi antes dos Geometry Nodes.

Eu não sei escrever scripts sozinho, então ter alguém no estúdio para ajudar foi inestimável. Mas o aprendizado nunca para de verdade. Ainda sinto que há muita coisa que não sei sobre o Blender ou qualquer outra coisa. E com esses projetos longos, às vezes você esquece coisas que aprendeu cinco anos atrás.

Também adoro a quantidade de recursos disponíveis online. Há tantos tutoriais e ferramentas, e consigo encontrar respostas para quase tudo rapidamente.”

Gints Zilbalodis, em entrevista para o Blender.org

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