Procomum e a cultura da Baixada 013

O Instituto Procomum e a cultura da Baixada  

Por Glaucia Rodrigues

 

No dia 26 de agosto aconteceu aqui no Procomum o Sarau dos Andradas.  O evento é realizado por Preta Jô e Poeta Gabriel, artistas da Baixada Santista que se organizam uma vez por mês para declamar poesia periférica na rua. Durante o evento, eu olhava no palco a potência de Allure e Neguinha Braba pensava que tanto Preta Jô, quanto Allure e Braba, em 2022, estiveram em nosso espaço fazendo parte da Colaboradora, a nossa escola livre de artes que seleciona artistas locais para um percurso formativo de um ano Foi a Colaboradora  que me fez conhecer boa parte dos artistas que hoje admiro na Baixada e que me levou a pensar: o que o Procomum tem a ver com a cultura da Baixada Santista?

 

Não farei mistério: o Instituto fica localizado na Bacia do Mercado, próximo a Catraia, região historicamente empobrecida pelos processos urbanos. Portanto, ter um espaço compreendendo biblioteca, sala multimídia, sala de coworking, cozinha industrial, galpão multiuso, ateliê de artes e costura já é disruptivo, mas somado a essa estrutura temos o abstrato: o olhar. O Procomum valoriza a arte e é lugar de encontros que florescem em festas, trocas e produções artísticas como o Ao Vivo no Estúdio ou a Collab Pride.

 

“Glau, antes de conhecer o Procomum, eu não tinha vivência de muita coisa artisticamente falando, lá eu conheci muito artista, artistas pretos, artistas LGBTQIAPN+, sabe? Pessoas que fazem teatro, que grafitam… Então é um local onde as pessoas e a diversidade se encontram e se expandem para fora do Procomum com o que colheram lá. Foi assim comigo. Eu não conhecia muita coisa e depois do Procomum eu expandi muito. É um lugar onde você vai se encontrar com a sua tribo, a sua galera e vai além” A MC Neguinha Braba

 

Por aqui, já passaram potências como a Dj e produtora Nanne Bonny, que movimenta diversos eventos fundamentais para a cultura do território, Andrey Haag que hoje coordena o coletivo Olhar Marginal, que registra e mostra as quebradas da Baixada, proporcionando um novo olhar sobre a nossa gente. 

 

“Tem duas formas de enxergar as coisas. Eu conheci pessoas que estão movimentando a parada e foram elas que me levaram para o Procomum. A Nanne, por exemplo, eu já conhecia, mas a reencontrei no Procomum. Essas pessoas foram fortalecidas pelo espaço. Já tínhamos relações, nossos “corres”, mas estar no Procomum, possibilitou o fortalecimento dessa rede de contato. Foi no Procomum que eu e a Nanne criamos laços e afinidades de trabalho. Lá aprendemos coisas, métodos e possibilidades. Foi no Procomum que eu conheci o terceiro setor, eu não sabia que a gente poderia escrever projetos, mandar e concorrer a algo. Também teve essa coisa da relação, do networking, poder trocar com pessoas. Hoje em dia eu não frequento mais festas como eu frequentava antes, se eu estou num lugar, eu quero conhecer pessoas, trocar contatos, falar sobre o meu trabalho e isso tem me ajudado muito. Recentemente estamos fazendo um filme com aporte vindo da Tide Setubal e eu aprendi isso (captação de recursos) no Procomum. Tem uma fala da Georgia que me marcou muito “Amigo, vc não tem que ter vergonha de falar do seu trabalho. se uma pessoas te prometeu algo em relação ao seu trabalho, vai lá e cobra”. O Procomum mudou a forma de me relacionar com as pessoas.” Andrey Haag, fotógrafo e produtor cultural

 

Por aqui também conheci Paty Miau e Magenta que já se conheciam, mas se reencontraram aqui e floresceram em Collab Pride, um espetáculo drag que atrai público de todas as sete cidades desse nosso mundinho praiano. 

 

“Procomum é um centro onde as pessoas se conhecem, têm contato com outras ideologias, outras ideias e conhecimentos. Muitas festas estão acontecendo com pessoas que passaram por aí pela colaboradora ou de alguma outra forma direta ou indiretamente” Paty Miau

 

Celebração é palavra presente tanto em nossas rodas de conversas, quanto em nossas metodologias, afinal para que serve o nosso corre do dia a dia se não para que ao final de cada conquista possamos celebrar e são muitas as festas que transbordam para além do nosso espaço, muitas delas movimentadas por pessoas que circulam pela nossa sede: Fabinho do Estúdio El Sonido, dá o som para inúmeros movimentos. O Estúdio fica localizado próximo ao IP e deve ser por isso que Fabinho sempre está por aqui, assim como Soledad Maria, nossa Coordenadora de Expansão e Impacto que além de dar vida ao LA Cuida, canta Gal, Belchior, outros cantores e as próprias canções em espaços que se estendem do Ceará, onde nasceu, à Baixada Santista, onde nos presenteia com sua  presença e luz. 

 

Por falar em equipe, Breno Garcia, Analista de Comunicação e também multiartista: fotografa, escreve, rima, pinta, pixa e sabe lá Deus o que mais ele faz durante as madrugadas que passa criando concentrado na Rádio que fica dentro da biblioteca que mencionei lá no comecinho do texto. Eu crio roupas e não fossem pelas mulheres que encontro diariamente no Procomum, talvez já tivesse deixado este segundo ofício de lado. No Procomum, eu vejo a Roberta dando vida ao ateliê de costura e às pessoas que procuram diariamente por ela aqui nos corredores em busca de aprender a criar com as mãos, no ateliê também encontro e, nas horas vagas, crio junto com Luciana da Cruz, do Grupo de Trabalho UnaNós e Camila, dona da Chinua acessórios. 

 

“Numa cidade como Santos, uma das coisas que mais impulsiona cultura são intercâmbios e plataformas, trocas entre artistas e essas trocas só podem acontecer em espaços seguros que promovam e incentivem essas trocas, que enxerguem a produção de cultura como algo que engrandece o território. Neste ponto o Procomum funciona como um espaço onde as pessoas podem se encontrar. O Instituto também promove dinâmicas, encontros e criatividade entre as pessoas.” Breno Garcia

 

Além de artistas, por aqui também circulam escritores e poetas como Julie Lua e Nego Panda. A Julie é uma mulher de trajetória admirável, desde muito nova batalhando por sobrevivência e escoando sentimentos em palavras. Semana passada, cheia de dedos veio me contar que ia lançar mais um de seus livros, mas não faria o evento no Procomum. Do muito que ela sabe, faltou entender que é parte do processo transbordar para outros territórios. Lua, se estiver lendo este texto: voa, mulher! O panda ginga capoeira enquanto declama poesia improvisada, toca berimbau e ri, um vórtex de uma negritude aflorada que brilha tanto quanto a pele daqueles que sauda.

 

Outra palavra muito presente no vocabulário de nós que impulsionamos o Instituto Procomum é “rede”, valorizamos a construção delas. Victor Marinho, Gerente de Inovação, sempre lembra que, para nós, protótipos de sucesso, são aqueles que constroem redes. Realizamos diversos laboratórios cidadãos que tem como um dos objetivos, o uso da criatividade que emerge da sociedade para pensar/ prototipar soluções para questões vividas pelas pessoas que as vivenciam. Neste ano realizamos diversos laboratórios e dentre eles, o LAB Tempestade em maio, no qual as pessoas puderam pensar em soluções para problemas provenientes das mudanças climáticas, os grupos formados seguem se encontrando e desenvolvendo as ideias que ali brotaram. 

 

“Tentar conectar a realidade das pessoas, ouvir histórias e narrar em parceria é o que buscamos aqui. Reconhecer a trajetória das pessoas e o saber que elas têm, independente de ser técnico ou não. Criar pertencimento com as pessoas, nos implicando nessas relações. A potência de ter um lab na baixada é receber pessoas que nunca são ouvidas, pois se é importante para aquela pessoa, é importante para nós” , o Diretor de Recursos que também é ator Fabrício Freitas

 

São muitos os nomes que circulam por aqui: a fotógrafa Bete Nagô, o Músico e poeta Wescritor, o Poeta Chagas, a  artista plástica Fixxa, a atriz Anita, as performers Eleonora e Diez…, tantas histórias que não cabem em um texto, mas queremos fazer mais. Queremos que as pessoas venham para o LAB com suas ideias e anseios. Estamos com uma nova fachada, novos membros na equipe e inúmeros projetos sendo propulsionados pelo Instituto e pelos Grupos de Trabalho auto gestionados por pessoas que conosco se conectam. 

 

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